domingo, 8 de fevereiro de 2015

Sem chão


A “reunião” com a coordenadora da escolinha foi uma tragédia sem tradução. Ela falou sem meias palavras que notaram que o Léo era uma criança diferente, que se desenvolvia de maneira diferente. Na hora saquei que ela iria falar sobre a questão do atraso de linguagem. Então perguntei: "Diferente como?". E ela me respondeu que ele não sentava em roda com as outras crianças, que muitas vezes o chamavam e ele os ignorava, que não trazia coisas quando pediam, que brincava isolado com alguns brinquedos. E, de repente, não mais que de repente, ela soltou a seguinte frase, que ressoa nos meus ouvidos até os dias de hoje: "Acho bom você procurar um pediatra e relatar isso para ele, seu filho pode ter algum problema de audição ou ser AUTISTA".

PÁ!  Tapa na cara!

A reunião terminou pacífica, mas não me recordo como terminou. Saí de lá tão transtornada que, ao abrir a porta do carro, não tive reflexo para sair de frente e dei com a porta com toda força no meu nariz. A dor no nariz era tão grande que demorou para eu reorganizar meus sentimentos. 

Assim que voltei a mim liguei para o Alexandre. Ele ficou com muita raiva da tal coordenadora por ela ter abordado tal assunto comigo sem nenhum zelo ou mesmo tato. Tentou me acalmar o suficiente para que eu pudesse ao menos dar sequencia a meu dia.

Cheguei ao trabalho em cima da hora. Entrei na sala de aula ainda transtornada. Era uma turma do 1º ano de Telecomunicações. Eu tinha passado para eles na aula anterior um texto com duas questões de simples interpretação e opinião. Apenas 3 alunos haviam feito. Aquilo mexeu comigo de uma forma, pois eram jovens inteligentes, capazes, estudando um curso técnico que oferece conhecimento, profissão, e justamente aquela turma demostrava não só na minha matéria um desinteresse, um descomprometimento total. Naquele momento não consegui evitar de pensar  que talvez meu filho nunca tivesse a chance que eles tinham nas mãos, e que eles,  por mera "bobeira adolescente", estavam jogando fora aquela oportunidade de aprender, de SER e de transformar. Aquilo me doeu na alma. Soltei um discurso para eles sobre o que estavam jogando fora, pelo seu descaso com as próprias oportunidades. Dei o maior sermão, e no final caí num choro desconsolado. Em nenhum momento citei meu filho e nem a hipótese dele vir a ser autista. Os alunos ficaram quietos com cara de culpados, olhos arregalados, pois imagino que nenhuma professora antes havia chorado porque eles não haviam feito a lição de casa. Hoje dou risada quando conto ou lembro disso. Mas no fundo ainda posso sentir aquele sentimento, mesmo que já tenha aprendido a cultivar a esperança. 

No dia 4 de setembro estávamos no pediatra do convênio, iniciando a jornada de investigação do Léo. Mencionamos o “diagnóstico” irresponsável da coordenadora, e ele imediatamente se queixou da série de reportagens sobre autismo do Dr. Dráusio Varela no programa Fantástico, e que por conta disso toda criança que demorasse um pouco para começar a falar as primeiras palavras já era rotulada como autista. Nos explicou que esse diagnóstico não era simples. Ele se colocou à disposição para acompanhar o Léo e nos disse que, com o Léo com apenas 2 anos e 5 dias, o que investigaríamos seria o atraso de linguagem, que poderia ser causado por diversos fatores distintos, e não somente o autismo. Tendo isso em mente, nos encaminhou para um neuropediatra.




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