segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Tempo de agradecer





Tempo de seguir novas e arriscadas etapas.

Em tempo: estou me devendo este texto.

Porque não é fácil receber o diagnóstico de autismo do seu filho, não é fácil encontrar alguém ou um lugar com quem você irá deixá-lo para ir trabalhar e saber que ele estará seguro, cuidado e, o mais difícil, aprendendo e recebendo o carinho e a atenção que envolvem o ato de ensinar. Neste medo, nesta insegurança, acabamos por ser acolhidos pela LUMI, onde nosso pequeno ficou aproximadamente quatro anos fazendo terapias, 20 horas por semana, e mais 2 horas de fonoaudiologia.

Foi na LUMI que deixava meu filho todos os dias de manhã com o coração em paz para seguir com o meu dia de trabalho. Meu receio era o período da tarde, quando ele ia para a escola regular como aluno de inclusão. Era no período da tarde que minha ansiedade dobrava. Os olhos sempre atentos no celular, para o caso de receber alguma ligação da escola. Era como se algum radar dentro de mim fosse acionado. As tardes eram meus momentos de alegrias e de agruras.

Não quero comparar aqui os dois ambientes (escola regular e espaço clinico da Lumi), até porque as propostas de ensino são bem diferentes. O que quero dizer é que meu coração de mãe especial terá sempre uma gratidão especial pela LUMI, pelas profissionais que atenderam o Léo, pela direção, e por todos os funcionários. 

Foram anos de ensino e aprendizagem, onde não só o Léo aprendeu. Nós, como pais, também aprendemos. Não apenas como pais, mas também como seres humanos, pois vivenciar e participar dos eventos e projetos do Instituto Lumi  nos reconectou com uma militância e ativismo que já havia um tempo que estava inativa.

O Léo chegou na Lumi ainda um bebê. Não falava, não se comunicava, era quietinho e ao mesmo tempo explorava todos os objetos da forma mais irregular para uma criança de três aninhos. Usava fralda, chupeta, comia sozinho com colher, mas não gostava de mastigar carnes. Aos poucos foi-lhe apresentado o PECS, fase 1, e foi um sucesso. Fazíamos tudo o que era sugerido pelas terapeutas. Logo veio a fase 2, ele parou de usar a chupeta, o desfralde que foi uma longa jornada, mas que todos da Lumi sempre nos incentivaram a persistir nas adversidades.  O Léo aprendeu as cores, as letras, a dançar, aprendeu a identificar musiquinhas, fez muitas coisas gostosas na culinária, aprendeu a quebrar ovo e tudo mais. Aprendeu a tomar banho e, como consequência, conhece as partes do corpo. Aprendeu a escovar os dentes, foi para fase 3 e 4 do PECS! 

Para quem não tem um filho atípico dentro da neurodiversidade, talvez não faça ideia de como é longo e paulatino o ensino e a aprendizagem de uma criança com TEA para a construção dessa autonomia.

Quem me conhece sabe que sou uma pessoa que crítica, que me queixo, que não tenho papas na língua. Mas a Lumi é uma Instituição que não tenho nenhuma queixa. Na verdade gostaria que existisse várias ”Lumis” pelo Brasil afora, e que muitas pudessem ser públicas ou que os convênios pudessem remunerar bem seus profissionais e terapeutas Digo isso porque muitas vezes a Lumi pesou no nosso orçamento, mas temos a certeza de que valeu cada centavo.

Algumas pessoas estranharam o fato de termos tirado o Léo da Lumi, pois sempre elogiamos e somos parceiros voluntários do Instituto Lumi. Tomar a decisão de tirar o Léo da Lumi foi mais difícil do que a tirar meu bebê da escolinha particular para matricula-lo na pública, já abordei esse tema em outro texto.

Hoje não temos mais um bebê, mas um menino que foi para o ensino básico fundamental como aluno de inclusão na escola regular. E essa mudança do ensino infantil da escola regular para o ensino fundamental está sendo bem difícil. Por natureza essa passagem já é complicada até mesmo para as crianças neurotípicas, quanto mais para as crianças público alvo da educação especial. E digamos que a escola regular para onde nosso filho foi acabou por fazer mais propaganda do seu projeto de inclusão do que realmente encontramos na realidade. Foram muitos os problemas e muitas as tentativas de ajudar o Léo e a escola. Mas chegamos à conclusão de que não estavam a fim de nos ouvir, e quando o nível chegou ao abandono, como no dia em que a escola que me ligou no meu trabalho, dizendo para eu ir buscar o Léo porque o meu filho havia ficado na chuva sozinho e estava molhado e sem calçado num dia em que a temperatura estava 15 graus, aquilo foi de envenenar qualquer projeto sério de inclusão, fora todos os outros problemas que já estavam somando. Um deles foi a escola insistir que o Léo não usava a PECS e que achariam outro jeito de se comunicarem com ele. Isso mesmo que vocês leram! Um “outro jeito” de se comunicar com ele, como se a escola tivesse mais autonomia desta decisão que nós pais e terapeutas, que há anos procuramos ensinar o Leonardo a se comunicar, uma vez que ainda não fala. Não vou me alongar sobre essa escola, pois teria que escrever um texto somente para esse período que o Léo passou por lá. 

O fato é que por mais de um mês o Léo ficou sem ir para a escola. Fiquei mais tempo com meu filho em casa devido ao recesso de meu trabalho, e porque a escola que estava demorou quase um mês para agendar a reunião sobre a “chuva” que meu filho tomou. Neste intervalo não o mandei mais para essa escola. Depois que ele saia da Lumi , ficava  com meus pais  ou num espaço de brincar com pessoas super humanizadas chamado Pé de Baraúna, onde toda vez que ia buscá-lo meu filho estava feliz e sabiam me dizer coisas que faziam sentido sobre ele. 

Este tempo fez com que passássemos a observar com mais clareza algumas mudanças do Leonardo nos últimos meses. Ele estava mais birrento, com crises de choro, com altos e fortes gritos e mais resistente para usar o PECS em ambientes que antes fazia uso adequado. Para nós da família passou a ser um momento muito difícil e resolvemos pedir ajuda à Diretoria de Ensino. Neste período passavam por nossa cabeça várias dúvidas: desistimos já da Inclusão e o deixamos na Lumi em período integral, ou tiramos ele da Lumi e o colocamos para fazer terapia em casa e damos mais uma chance a educação inclusiva?  Infelizmente não temos grana para uma 3ª opção, que seria o deixar na Lumi e também fazer terapias em casa. 

A equipe de profissionais da Diretoria de Ensino sempre manteve um diálogo muito aberto e sincero com a gente, e desta vez não foi diferente. Mesmo diante de todas as limitações que existem na educação pública inclusiva, deram bons argumentos e novos horizontes para continuarmos nessa luta. Resolvemos então dar esse novo passo na nossa jornada. O Léo mudou de escola, onde foi bem acolhido. E optamos por tirá-lo da Lumi, substituindo-a por uma terapeuta em casa.
Foi muito difícil dar a notícia na Lumi sobre a saída do Léo. Mas, de qualquer forma, ainda estamos lá, fazemos terapia de fonoaudiologia duas vezes por semana na Lumi. Quem sabe ainda não faremos mais sessões? 

É quase um dever meu vir aqui e elogiar o trabalho de todos da Lumi. Seremos eternamente gratos por tudo o que aprendemos, por todas as trocas e, claro, pela certeza de que o Léo sempre se sentirá seguro com qualquer pessoa da Lumi. Certeza que o Léo sente saudades, que sentimos saudades, pois acabamos por criar um laço de amizade e respeito.

Então, se algum dia alguém vier me perguntar o que acho da Lumi, direi que é excelente! 

Recomendo!

Por hora cada um tem sua história, seus percursos e escolhas. Nem toda partida é por motivos negativos. Escolher novos caminhos faz parte da vida, e assim segue a nossa. Se um dia a gente perceber que temos que fazer o retorno, nós retornaremos, pois já experimentamos e aprovamos. Afinal, sabemos que nossa escolha é bem arriscada, ainda mais nos tempos de hoje em que entramos numa “nova era” onde o governo quer negar a diversidade de gênero. Como é que será o futuro em relação à inclusão das pessoas com neurodiversidade?

Temos uma questão de princípios com a escola pública, inclusiva e de qualidade. Sabemos que esse é um espaço que está sendo construído e não podemos deixar ser tomado ou negado. Seguiremos nesta luta. Mas é claro que a segurança do nosso pequeno sempre virá em 1º lugar.

Obrigada a TODAS e TODOS da Lumi que estiveram junto com a gente nesta jornada e que de certa forma ainda estão.



 VOCÊS SÃO MARAVILHOSXS!!








E contem com essa família Azul sempre que precisarem!