segunda-feira, 27 de julho de 2015

Em busca de tratamento precoce




Como contei em outros textos aqui do blog, na última consulta antes do diagnóstico comecei a ler e estudar mais profundamente sobre o autismo. Se a realidade que se apresentava era essa, tinha que me preparar. A Lei Berenice Piana deixa claro que é um direito o diagnóstico precoce, com o objetivo de se iniciar logo um tratamento. Desta maneira a criança tem mais chances de desenvolver suas capacidades. Então, além de conhecer o que leva a um diagnóstico de TEA, é necessário saber também sobre o 2º passo: Quais tratamentos existem e quais deles funcionam.

Essa é uma etapa árdua para nós brasileiros, pois a Lei que nos protege existe, mas o tratamento adequado ainda não.

Dois dos meus melhores amigos da época de faculdade me colocaram em contato com sua irmã,  que mora nos EUA e que tem uma vasta experiência trabalhando com autistas, inclusive  atuando de forma militante para ajudar pais de autistas aqui no Brasil. Ela nos apresentou o A.B.A. (Applied Behavior Analysis ou Análise Comportamental Aplicada), que é uma abordagem utilizada pela psicologia em casos de autismo. Nos contou como são os tratamentos nos EUA, seus objetivos e, o mais importante, que essa abordagem é a única que apresentou evidências científicas suficientes para ser considerada eficaz.

Comecei a pesquisar mais sobre ABA, e quanto mais pesquisava mais me convencia que era esse caminho que deveria tomar para o tratamento do Léo.

Com relação à fonoaudiologia, conversei com a fonoaudióloga do Leonardo logo após o diagnóstico, e ela me informou que o encaminharia para uma outra fono que havia na clínica, pois ela trabalhava com autistas, e inclusive fazia mestrado na área. Ficamos muito felizes com a notícia. 

Mas, pra variar, nem tudo são flores. Era dezembro, e a “nova” fono só iria abrir a agenda em meados de janeiro. Passamos dezembro com a Fono que acompanhava o Léo desde 2013. Na última consulta, de dezembro de 2014, antes de iniciar as férias, a fono nos comunicou que não atenderia mais o Léo, pois entendia que ele precisava de alguém especializado. Mas também nos informou que a fono que havia recomendado não poderia mais atendê-lo, pois passaria o ano de 2015 estudando no EUA, já que havia ganhado uma bolsa ou algo do gênero.

Mais um problema. O Léo já não fazia Terapia Ocupacional  há meses, devido à incapacidade dos gestores  da área da Saúde como comentei no texto Ouvidos Moucos. Agora estávamos sem Fono, e sem saber onde iríamos encontrar tratamento adequado para autismo.

E, mais uma vez, meu calvário se repetia. Para a felicidade da Senhora Ansiedade que mora em mim, ainda estávamos no fim de ano, quando tudo para. Todos festejando, férias, etc. Só poderíamos resolver essas coisas em janeiro ou fevereiro. Se bobear apenas depois do carnaval. Foi enlouquecedor. Novamente teríamos de esperar.



Mas esperar com o diagnóstico em mãos foi menos sofrido, por mais contraditório que isso possa parecer. Agora eu sabia o que meu filho tinha, sabia que poderia fazer alguma coisa. Preenchi essa espera com muito estudo, muitos contatos, e diversos “nãos”.

Nestas pesquisas, conheci uma clinica-escola particular onde usam o ABA e o método Teacch - (Treatment and Education of Autistic and related Communication-handicapped Children ou Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits relacionados com a Comunicação). Fui no mesmo dia conhecer o local, pois era perto de casa. O lugar me pareceu ser bastante sério, e a impressão que tive foi de que o tratamento realmente funcionava. 

Mas a ferida do luto ainda estava presente. A clínica-escola era toda branca, asséptica, sem a típica algazarra de crianças correndo e brincando felizes pelos corredores, como em uma escola típica. A clínica se sobressaía à escola. E o preço? Era um investimento muito alto para nós naquele momento. Para que pudéssemos colocar o Léo lá teríamos que tirá lo da escolinha particular, e ainda assim colocar muito mais dinheiro. Pensar nisso foi assustador. 

Também fui procurar o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial infantil da rede pública) da região onde moro. Liguei e marcaram uma entrevista com a psicóloga. A tal da anamnese. Mais uma anamnese.

A conversa com a psicóloga do CAPS foi muito estranha. Durante a entrevista eu a informei que o Léo já havia sido diagnosticado, que fazia terapias, que o diagnóstico foi clinico, realizado através de um olhar multidisciplinar. Ela me perguntou o que eu sabia sobre autismo. Falei para ela sobre o que tinha lido e sobre o ABA. Foi quando ela me perguntou: “Por que você veio aqui?” Não me lembro se respirei fundo ou se me faltou o ar. Como assim, por que tinha ido ali? O que ela queria dizer com aquilo? Depois de meia hora de conversa ela me solta essa? Então perguntei: “Por quê? Disseram que é o CAPS o responsável pelo tratamento de autismo. Não é aqui que eu deveria procurar?” Ela respondeu que sim, era ali que deveria procurar, mas que eu parecia ser uma mãe esclarecida, e que eles trabalhavam com abordagem psicanalítica com as crianças. Disse também que iriam fazer uma nova avaliação com o Léo. Ela não deixou claro se questionariam o diagnóstico dado até aqui, pois o médico psiquiatra deles não gostava de diagnósticos efetuados sem a sua observação. 

Achei tudo muito esquisito. Sai de lá muito mal, sem acreditar no que tinha ouvido. Na minha versão, aquele comentário quis dizer o seguinte: “Você é uma pessoa esclarecida, aqui atendemos com abordagem psicanalítica, pois é o que sabemos, e não temos como atender de outra forma. Então enganamos as mães que não são esclarecidas como você, pois a psicanálise não vai levar muito longe as crianças que atendemos.” 

Que horror! Isso me adoeceu! Chorei tanto, tanto! Não por mim, ou pelo Léo, mas pelas mães que levam seus filhos à essas terapias, que são obrigadas a largar seus trabalhos, dividir seu tempo entre a jornada de emprego e as idas às terapias, trabalho doméstico e os outros filhos. Mães que batalham diariamente em uma vida extremamente complicada, com a esperança de estarem fazendo o melhor para seus filhos. E o que acontece? As capacidades destas crianças ficam aprisionadas, assim como suas inteligências. 

Eu voltei a me deprimir. Tinha que lutar pelo meu filho neste momento, mas a militância de mãe de autista havia me tocado. A impotência de não poder  fazer algo me socou o estômago, me tirou o sono, me trouxe enxaquecas.



Procurei o AMA (Associação Amigos dos Autistas), que faz um trabalho lindíssimo com ABA, mas é distante demais de onde moro, e mais ainda de onde trabalho. O mesmo aconteceu com o Projeto Amplitude, além de eu não me encaixar na proposta de renda mínima para o atendimento.

Sem muita opção, resolvi seguir com as avaliações no CAPS, e ver o que iriam me dizer. Mas sabia que precisava procurar alternativas. Neste meio tempo conheci o Grupo Gradual, em Pinheiros, e achei a proposta deles maravilhosa. Mas, novamente, pesaria no bolso. Meu esposo estava em um projeto que acabaria no final de dezembro, e não poderíamos nos comprometer com valores altos para as terapias sem ter uma noção de qual seria nossa renda no ano seguinte.

Distância, abordagem, valores, recesso de fim de ano. O Léo sem fono, sem Terapia Ocupacional, e agora, mais do que nunca, autista.

Eu precisava agir. Foi quando meu médico psiquiatra me indicou uma colega que trabalha com autismo. Ela novamente me recomendou o Grupo Gradual. Mesmo sem uma certeza sobre nossa renda, sabíamos que precisávamos fazer alguma coisa, então encaramos os fatos e submetemos o Léo a uma avaliação na Gradual. Fizemos uma entrevista em Dezembro de 2014. A conversa foi ótima. É muito bom conversar com quem entende do assunto. Mas as avaliações seriam em janeiro, assim como a devolutiva, quando nos informariam de que maneira poderiam ajudar o Léo.

Saímos da entrevista aliviados. Tivemos a certeza da abordagem, seria ABA.  O Alê sabia que teria que achar outro trabalho rápido, pois teríamos que encarar aquele investimento. Mas também precisaríamos esperar. Não havia outro jeito. CAPS, Gradual, outra fono, outra TO. Tudo incerto. 

Tudo só em 2015.



Um ano novo iria começar.

Continua...




terça-feira, 7 de julho de 2015

Elevador

Está história está fora da linha cronológica do Blog. Tinha postado este acontecimento no meu perfil do face. Mas, alguns amigos me disseram que era para postar aqui. Ouvindo os amigos, aqui está.




Elevador é um lugar estranho.

Passamos por um constrangimento por segundos ao ter que encarar um estranho.

Você e o estranho se compartimentam e fica aquele silêncio, até que alguém se vá.

De repente o estranho, não é mais estranho, passa a ser seu companheiro de elevador. Se topam toda hora.

Tem vezes que nem é constrangedor, pois o estranho é um simpático que fala uma conversa de segundos. Acontece. Mas isso também é estranho.

O que é comum no elevador são as pessoas brincarem ou falarem com crianças. Como se isso não fosse constrangedor para elas.

Pois então, não seria diferente com o Léo. Se não bastasse ele não falar, outra característica do autismo é que eles não sabem cumprimentar, não se importam com isso. Não ligam para aqueles que dizem "Oi mocinho!", "Que menino bonito! Vai passear?" O Léo ignora completamente cumprimentos, principalmente no elevador.

As pessoas ficam constrangidas com a falta de resposta dele. Geralmente eu respondo por ele tentando ser simpática. Não dá para explicar em segundos que ele é autista. E nem sempre acho que as pessoas merecem essa informação no elevador.

Mas agora que ele está grandinho, é comum as pessoas perguntarem o nome dele. "Oi, como você chama?" E, ele nem aí, geralmente olhando para os números do painel que indica os andares. Ao ignorar a pessoa, eu respondo por ele. A porta abre, desembarcamos e tudo resolvido.

No entanto tem gente que força um pouco mais a resposta dele. Mexem, brincam com ele, e olham para mim inventado alguma desculpa por terem sidos ignorados. "Ele está concentrado no painel", "Ele está cansado?"

Mas tem gente mais insistente ainda "o gato comeu sua língua". Aí minha língua não aguenta e diz "Ele não fala". Alguns não se constrangem e continuam, "mas quantos anos ele tem???".

"3 anos e não fala”. Se tudo der certo a porta abre antes do fim da conversa. Mas sempre há tempo de alguém falar de um parente que demorou para falar...

Outro dia estava no hall esperando o elevador. Chegaram duas senhoras. O Elevador chegou. Entrei com o Léo e segurei a porta para elas entrarem. Disseram que iriam esperar alguém e deram tchau para o Léo. O fofo do Léo retribui mandando beijo. Neste momento a terceira senhora chegou a tempo de entrarem no elevador, encantadas pelo beijo do Léo, começaram a falar com ele.

"Ah, eu sei o nome dele. É Joãozinho". A outra "Acho que não. É Pedrinho".

Para meu constrangimento o elevador que deveria subir, desceu.

Enquanto elas falavam o Léo vidrado no painel, pois agora está vocalizando alguns números do painel (1,8,9, 10, 11 e comemora o 16 nosso andar).

Quando a terceira senhora ia inventar outro nome e perguntar ou perguntar o nome dele...

Eu disse na maior naturalidade "O nome dele é Leonardo, ele AINDA não fala. É autista. E está tentando contar os números do painel. Nós estamos voltando da fono.

"OoHHH!! Que lindo!"

Ficaram ouvindo ele fazer sonzinhos para os números, perderam ele falar o Hum, e desceram antes do OITO.

Nos deram parabéns. Não sei bem o porquê.


O bom de ser autista é que isso não vai ser motivo de constrangimento. Nem no elevador.